sexta-feira, 24 de outubro de 2008

Dia 12

É o dia mais difícil de relatar. Foi o mais movimentado com atividades fora de trabalho. Nunca comentei as atividades de trabalho, pois estas, na minha opinião, são restritas. Optei por mostrar o que se pode fazer fora do trabalho por quem não gosta de ficar internado em hotel ou pousada, bem como minhas impressões dos lugares por onde passei. Esta é a oportunidade para se conhecer as pessoas locais, saber como vivem, do que vivem, coletar impressões sobre a cidade e arredores, enfim, vivenciar momentos únicos de aprendizagem sobre a sociedade brasileira para além dos livros e telejornalecos de TV, que ultimamente se dedicam a dois temas. E esta viagem me propiciou bons momentos, apesar de estar sozinho. Infelizmente, um blog não suporta a quantidade de informações que gostaria de passar, além do que este não é o objetivo principal desta viagem.
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Acordei lá pelas 7 da manhã. Tomei banho e fui tomar café. A idéia fixa na minha cabeça era a de ir para Jericoacoara, um lugar espetacular aqui por perto, de moto. Iria pelas estradas vicinais de terra, passando por distritos pequeninos até chegar lá. No caminho, outras praias seriam visitadas. Ao todo seriam 3 em 70 km só de ida, mais ou menos. Seriam.

Saí de moto às 8 e meia e segui o caminho que tinha estudado pouco antes com as fotos que tirei de um mapa do transporte escolar local. Foi providencial, mesmo eu tendo me informado antes dos caminhos. Não existem mapas locais para vender em nenhuma banca.

No caminho de estradas de terra boas, às vezes com areia, fui me informando com os locais sobre onde ficava Aranaú, primeiro ponto de referência. Foi tranqüilo, apesar de ser longo o caminho por terra, com algumas bifurcações. Procurei memorizá-las, mesmo sabendo que, no caminho de volta, a percepção do caminho muda, assim como os pontos de referência. Afinal, não estava em estrada tradicional de asfalto, mas em estrada de terra desconhecida por mim. Pela estrada de asfalto seria bem mais rápido, mas não tão legal, claro. Também não teria o contato com a população local.

Chegando na sede do distrito, perguntei sobre o projeto de energia eólica que uma empresa, em parceria com o governo federal (assim entendi), está implantando por aquelas bandas. Me indicaram o caminho e segui para uma praia, que mais tarde descobriria ser a praia do Morgado. Perguntaram se eu era “bom de areia”, já que teria que andar de moto na praia até chegar na região onde estava se instalando o projeto. Eu só ri, mas fui.

Ao avistar uma pequena duna de areia branca que impedia a visão do mar, bem na frente do ponto final da estrada, fiquei preocupado. Ao lado de algumas barracas de madeira fechadas, deixei a moto e escalei a duna de uns 10 metros de altura, mas relativamente larga. Lá de cima tive uma visão que gerou sentimentos conflitantes ao mesmo tempo. O mar verde e crispado era lindo. O rio pequeno que corria ao longo da praia e desembocava no mar logo adiante era parecido com os vários que já tinha visto no sul da Bahia: marrom claro mas cristalino. A areia escura, cor de chumbo, não dava uma boa impressão. Mas o que me impressionou mesmo foram os tocos de um manguezal destruído entre as dunas e o rio. A combinação do vento fortíssimo, o mar de tocos antes do rio e a cor da areia (cor de manguezal) dava ao local um aspecto de terra destruída, arrasada, muito embora o mar logo ali adiante fosse lindo. Sensação estranha.

Depois de alguns minutos, comecei a procurar entre as dunas caminhos de passagem. Para ir aonde queria, precisava andar pela praia e pelos tocos de mangue por alguns quilômetros. Enquanto observava, um motoboy local veio pela praia e entrou numa “fresta” de dunas e saiu ao lado das barracas, andando pelo laguinho seco que havia por ali. Fiz o mesmo no sentido inverso e saí na praia. Segui adiante com cuidado, pois os tocos mais finos poderiam furar o pneu da moto. Mais adiante os tocos terminaram, bem no trecho onde o rio desembocava no mar. Restava o vento, a praia escura e o mar verde.

Andei alguns quilômetros, passei pelas obras do projeto sem saber naquele momento (fui descobrir na volta, por outro caminho). Do outro lado, havia somente montes de areia remexida. A vegetação fora cortada. Alguns barcos de pescadores e armadilhas de pesca lembravam a atividade de sobrevivência dos habitantes mais antigos. Por falar nisso, neste município não vi nenhum pescador com a minha idade. Todos sempre mais velhos. Segui até um riacho de cheiro ruim que desembocava no mar. Esgoto das localidades ou dejetos de tanques de criação de camarão, atividade que costuma gerar renda para as populações locais e destruição onde se instala. Desapontado, resolvi voltar. Não achei o que procurava: aqueles equipamentos eólicos que lembram hélices de avião gigantes. Mal sabia eu que tudo estava em fase inicial de construção e que até já havia passado do local que procurava...

Voltei para a estrada e segui rumo à localidade de Castelhanos. Me surpreendeu positivamente a sede de Aranaú, asfaltada e organizada para uma localidadezinha do gênero. Aliás, por todo o caminho não cheguei a ver casas ruins, caindo aos pedaços, sem reboco, como é comum no interior de Goiás, por exemplo. As casinhas eram pequenas, muito simples, mas minimamente arrumadas, ao menos por fora.

Mais adiante, em Carrapateiras, há duas lagoas de água doce, uma de cada lado da estrada, de cor verde claro. Sei que é de água doce porque, na volta, resolvi tomar um banho em uma delas. Bem rasinhas, limpas e com temperatura deliciosa, este banho foi providencial. Fiquei uns 15 minutos por lá. As pessoas que passavam pela estrada me olhavam com surpresa. Só pescadores entram nas águas. Não há o hábito de se refrescar em lagoas ou no mar, até porque este, pelo que vi, é muito difícil de se chegar a pé e me deu a impressão de ser violento por ser muito açoitado pelos fortes ventos.

Por fim, cheguei a Castelhanos. Fiz a milésima pergunta sobre caminhos, desta vez querendo saber como se chegava à praia do Preá. Segui por mais uns quilômetros até outra vila que não sei o nome. A essa altura já havia passado por algumas caminhonetes e jipes importados. Nesta vila vi um sujeito de quadriciclo, uma oficina de bugues e dois postos de gasolina. Não vi pousadas e nem lanchonetes. Era apenas uma vilazinha.

Em cinco minutos a última casa passava pelo meu lado direito e as ruas de barro tornavam-se trilhas de areia numa planície de grama verde musgo bem baixinha espalhada na planície. À frente, bem ao fundo do horizonte, dunas gigantes. Andei por quilômetros neste cenário. Mas na areia, com a moto que eu tinha e a minha inexperiência, a coisa não dava muito certo. Mesmo assim, segui em frente. Num certo momento, resolvi andar pela grama rala, já que esta propiciava mais tração para a moto, embora fosse mais irregular. O terreno ora aplainava, ora se acidentava. Cheguei até onde pude, onde acabava a grama e começavam as dunas altas. Via o mar próximo, mas não havia como chegar lá, a não ser a pé. Mesmo um pouco distante, percebi que havia animais pastando na praia. Já tinha percebido que a grama, na verdade, era um grande pasto para gado, pois estava cheio de cocô de vaca. No meu campo de visão, contei meia dúzia de palmeiras ao me redor. E só.

Neste lugar eu fiquei com uma sensação de estar num deserto. Era um lugar bonito, mas muito diferente do que sequer tinha imaginado. Além do mais, as dificuldades de andar de moto eram grandes, mesmo tendo uma moto mais ou menos preparada para o off road. Caso ela quebrasse, no máximo eu teria que andar carregando-a até o povoado. Ia ser complicado, demorado, mas perfeitamente possível. Pensando nisso, mesmo com Jericoacoara a menos de 10 km, resolvi voltar deste ponto. Pude fazê-lo com mais calma, afinal, ainda eram 11 da manhã.

A volta foi mais tranqüila. Já sabia o caminho. Mesmo assim, como havia previsto, tive a sensação de não ter passado por alguns lugares. Tomei o banho na lagoa, entrei por outro caminho para ver o projeto eólico em construção e entrei em Aranaú. Perguntando como sair de lá para Acaraú, um senhor me indicou outro caminho, diferente do que tinha feito na ida. Era de asfalto. Eu segui este caminho, até porque havia sido informado no dia anterior que existia um caminho por estrada de asfalto até Aranaú. No fim das contas, seria mais um para eu conhecer e, provavelmente mais rápido. Dito e feito.

Pude fotografar alguns lugares que não tinha fotografado na ida. Mesmo assim cheguei em Acaraú ao meio-dia e meio. Fui direto a um restaurante bem legal na entrada da cidade. À 1 e meia estava chegando ao hotel para descansar. À noite dei uma última volta pela cidade.

Minha volta a Brasília começará com a saída marcada para as 8 horas da manhã daqui. Devo chegar entre 10 e meia e 11 horas da manã. Meu vôo está marcado para as 13 horas e 10 minutos.

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Minha idéia com este blog foi passar um pouco desta minha viagem de trabalho em campo. Foi minha primeira experiência e, confesso, achei bem interessante. Achei que haveria problemas de comunicação via internet, mas não ocorreu. Também achei que me tomaria muito tempo. Isso ocorreu. Talvez se estivesse com outra pessoa eu tivesse mais dificuldades neste aspecto, muito embora ficasse mais rico, mais interessante (eu acho). Espero ter atingido meus objetivos.

Obrigado pela visita!

Reinaldo

Um comentário:

Anônimo disse...

Grande Rei... ficou muito bom essa descrição....
Força total..
Abraço